*Por Talita Guimarães
Eu devia ter uns 11 anos quando a ouvi pela última vez. Foi na mesma época em que a conheci. Fazia parte do repertório do coral infantil da escola em que eu estudava. Não por acaso coordenado pelo meu pai, que é músico e professor. Exímio conhecedor de um cancioneiro que as rádios não passam adiante, meu pai sempre foi minha antena mais apurada para assuntos musicais.

Arte: Talita Guimarães
Faz 17 anos desde então e eu não esperava ser tomada pela mensagem de tal canção em uma noite despretensiosa de uma sexta-feira deste 2017 que tanto tem me feito pensar sobre caminhos, escolhas pessoais e o poder de toque das crenças que praticamos.
É inclusive curioso como muito das músicas que conheci na infância, volta e meia retornem em minha vida adulta cheias de renovado significado. Para além da memória afetiva dos momentos que embalaram, agora são as letras que brilham com especial sentido, compreendido graças aos anos acumulados que nos ensinam o que há por dentro de cada palavra.
É com o coração subitamente aquecido que ouço meu pai cantar Amor de Canela do cantor e compositor maranhense Betto Pereira. A doçura que papai emprega em sua voz afinada, em perfeita sintonia com seu violão cada vez melhor, me faz cantar por dentro a letra que aprendi aos onze anos e nem sabia mais que seria capaz de lembrar.
Aos 28, caio para dentro de cada verso como quem cavalga no “cavalo cansado, à beira do caminho”, sentindo exatamente o que diz a letra quando afirma “quanta gente boa andando sozinho”.
Na primeira oportunidade diante de um computador, busco pela música na internet, mas os registros são escassos, incompletos. Não há Youtube, Spotify e Google, com todo seu relevante arsenal de informações, que dê conta do mundo. Sobretudo daquele que habita dentro de nós.
A oralidade ainda vence, atuando sorrateira. Não tão raro, abrindo morada em nossos corações humanos e estabelecendo vínculos duradouros entre as pessoas.
Especialmente nesse caso, é graças à memória oral que canto como lembro, sei do que existiu e ainda reverbera o suficiente para me comover, forte o bastante para que eu passe adiante, como um dia o fez meu pai, com sua caligrafia linda em um quadro de giz para uma turma de crianças que enchiam as manhãs de sábado de uma cantoria alegre, na região metropolitana de São Luís. Afinal, como dizem os versos de Pereira “Não estamos sozinhos/Cantamos um chorinho”.
Amor de canela
(Betto Pereira)
“Cavalo cansado
À beira do caminho.
Quanta gente boa
Andando sozinho.
Pinto uma senhora
Dona do Destino.
Amor de Canela
Roseira de espinho
(2x)
Não estamos sozinhos
Cantamos um chorinho
Faça o seu som
Cor de todos os ninhos.
Todos os corações
Cantando em desalinho. (2x)”
Talita Guimarães: Ensaios em Foco | Instagram | Twitter
Fiquei extremamente sensibilizsdo com esse texto,pois amor de canela de Beto Pereira e Manoel Pacifico fez a minha introduçao na musica pipular produzida no maranhão em meados dos anos 80 e feliz pela bela teferencia poetica e saudosa de tempos e noites de pura magia. Obrigado Jo Santos.
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