*Por Meiri Farias
Depois de pensar sobre a letra da música “Pra Acordar”, parece que sobra pouco a dizer. Mas como a proposta é fazer a resenha do show de lançamento do disco “Dois Tempos de Um Lugar”, sigo compartilhando minhas impressões sobre o trabalho de Dandara e Paulo Monarco, que mostram continuamente que arte é tudo que exala de suas performances.

Foto: Chema LIanos
Encontrar o espetáculo que já caminha há alguns anos no palco do Auditório Ibirapuera dá um sabor especial. Não há palco mais bonito na cidade e é difícil imaginar encontro mais certeiro do que esse. O templo da música recebe dois artistas que cantam como quem se prostra em oração. Não apenas por suas canções ou pelo que dizem, mas principalmente pela forma que permitem à arte atravessar seus corpos. Dandara e Monarco são o próprio rito e a liturgia de sua apresentação é reverência a única crença que importa neste solo sagrado: o poder transformador da música.
O disco sintetiza muito bem esse estado de contemplação ativa na qual nos colocamos quando se trata de Dois Tempos. A Bia apresentou recentemente uma resenha do disco (leia aqui) e já entrevistamos a dupla pouco antes do processo de financiamento coletivo do disco começar. Mas creio que vale destacar o “efeito” que esse trabalho proporciona no palco. Ao ouvir os artistas interpretarem suas canções, o contemplar se torna verdadeiramente verbo, porque somos nós também alterados durante o espetáculo, algo se move. Não se trata mais de espectadores passivos, nós também entramos no culto.
Fotos: Chema Llanos
Com composições de artistas contemporâneos como Celso Viafora, Maurício Pereira, Suely Mesquita, Marcelo Segreto, entre outros (alguns deles na plateia, inclusive), Dandara e Monarco apresentam todo o repertório do disco em um espetáculo com grande apelo visual. As projeções na parede contracenavam com um jogo de luz e sombra e, como de costume, a parede do teatro sendo suspensa em momento chave da apresentação, expondo o parque e a noite de domingo. Momentos como “Toca aí”, que despertou emoção geral ao Dandara interpretar totalmente a capela, depois de uma falha na sua guitarra; ou sentados no chão, cantando “Trovoa” – que bem pode ser uma das canções mais bonitas já escritas – merecem ser citados. Mas faço um adendo especial para “Pra Acordar”, logo no início do show, logo no início do texto. Venho repetindo essa letra mentalmente toda noite desde que a escutei pela primeira vez, a cerca de dois anos, se tornou um mantra. Ao escuta-la ganhar vida no palco, compreendi que não rezava sozinha e a emoção geral no Auditório foi a prova concreta.
O show acaba (antes do retorno para o bis), como a música “Madrigal” que explica muito bem de que matéria são feitos estes artistas “minha voz essa presença, que já recebi de herança, é uma cama sempre feita que o tempo não desfaz”.
Perto do fim do show, meu pai que acompanhava a apresentação ao meu lado soltou uma exclamação discreta “é tão bonito isso”. A simplicidade e certeza com que disse foi uma resenha bem mais certeira que a minha. A minha conclusão, por fim, dialoga com “Madrigal”. O único desejo que sobra, é que Dandara e Monarco perpetuem o seu canto. É o meio e a resposta para a oração.
Ouça o disco completo no Spotify: