*Por Talita Guimarães
Caro Garotinho,
Você estava longe, talvez não lembre de mim. Eu era a mocinha sentada no abrigo do posto de moto táxi naquela manhã nublada em que você dava voltas de bicicleta na pracinha da matriz.
Decidi te escrever no momento em que te vi persistir para subir uma rampinha com sua grande bicicleta azul. Você pegava impulso, mas nunca parecia ser suficiente para ir do estacionamento à calçada. A bicicleta ou descia a rampa de volta ou errava o degrau te colocando no nível anterior. Acompanhei com curiosa atenção sua batalha para acessar a calçada e por mais de uma vez comemorei internamente quando você conseguiu.
O que mais me chamou atenção foi que mesmo após conseguir, você sempre voltava para tentar de novo e encarava as mesmas dificuldades até vencê-las com esforço.
Essa atitude me fez perceber em você uma determinação que nos falta a muitos adultos. Só queria poder te lembrar, se um dia você esquecer de persistir, que você traz consigo uma porção generosa de uma virtude que quando fores mais moço lhe será muito necessária. Útil até.
É que quando somos crianças sabemos de coisas que não desconfiamos saber. Agimos com uma sabedoria que só um instinto inocente pode nos trazer. Há qualquer coisa de Leminski nisso, “distraídos venceremos”.
Talvez você não lembre, talvez você esqueça. Ou não, quem sabe você saiba, quem sabe isso em você nunca desapareça. O que importa carregar para encarar de peito aberto a vida já está dentro de você.
Escrevi esta modesta cartinha na esperança de que tal lembrança da infância o impulsione rampas a cima sempre que a vida te soprar para trás e você não lembrar da manhã nublada na pracinha.
Porque lembrar de quem fomos na infância nos ensina a ainda sermos os mesmos, só que um cadim mais fortes. 😉
Com o carinho da amiga do abrigo amarelo de madeira,
Talita.
Lindo!!!!
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