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Questão de Opinião: Chatô, o Rei do Brasil

São

*Por Meiri Farias

Chatô é um filme que entrou para a história muito antes de seu lançamento. A adaptação do livro de Fernando de Morais que revela algumas das facetas do nosso magnata, ou melhor, jagunço da imprensa brasileira, Assis Chateuabriand, começou a ser concebido em 1995, quando o ator Guilherme Fontes – sem experiência anterior com direção – comprou os direitos para a adaptação. Depois de 20 anos de polêmicas relacionadas a captação de recurso e o tema se tornar quase que piada pronta no universo jornalístico, ninguém botava fé, mas Chatô saiu!

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“Chatô, o rei do Brasil” foi um dos primeiros livros que li na faculdade, indicação do mestre Marcelo Cardoso nas aulas de história do rádio. Lembro do Cardoso dissertando brevemente sobre a influência de Chatô para a consolidação do rádio no país (e posteriormente da TV), e como mesmo com seus métodos questionáveis – muitas vezes realmente criminosos – gravou seu nome na história da imprensa do país. Já na época da leitura, surgiu a curiosidade de ver como isso tudo seria retratado em tela grande. Curiosidade essa que foi se ampliando a medida que o nome de Chatô era relembrado em sala de aula. História da Arte? olha o MASP aí para contar história. Jornalismo de revista? como estudar sem passar pela O Cruzeiro? e assim por diante.

O resultado está muito longe de ser um registro historicamente exato e isso é sem dúvida o maior trunfo do filme, que tampouco segue a risca a narrativa de Morais. Chatô, o filme, é um delírio de Guilherme Fontes sobre o personagem delirante que foi o dono dos Diários Associados, mas é dentro dessa proposta quase maluca que o filme faz sentido. Chatô é um filme pretensioso e isso não é uma crítica negativa. Brincando com a não linearidade, o longa vai retratar alguns pontos interessantes da trajetória do jornalista no contexto de um grande julgamento que acontece, acredite se quiser, em um programa de auditório no maior estilo Chacrinha, com decoração modernista (o quadro Operários, da Tarsila do Amaral faz parte da decoração). As cores, o exagero, reflete bem o papel que Chatô desempenhava e como desempenhava. O início marcado por um ritual de canibalismo, onde o paraibano disserta suas raízes “ameríndias”, brinca com esse cenário antropofágico e mostra uma Brasil moderno e tribal que que foi engolido pela megalomania do jornalista, este que se fez “engolir” pela elite excludente do período. O desenvolvimento do enredo é lúdico e o ritmo agradável por não se arrastar longamente em narrativas cronológicas.

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As interpretações levemente caricatas – Marco Ricca faz um Chatô-personagem, engraçado e “jagunço”, sem perder a mão – Andrea Beltrão é Vivi, paixão do jornalista (uma espécie de adaptação de musas de Chatô como Iolanda Penteado) também está ótima na tela. Paulo Betti é o presidente Getúlio Vargas, horas aliados horas desafeto do jornalista – esse sim em uma caricatura forçada e pouco crível. O eixo do filme, julgamento de Chatô rende momentos memoráveis como Getúlio assumindo o papel de advogado do réu e suas ex esposas – e respectivamente os sogros, fazendo parte do júri. As cenas com Gabriel Braga Nunes, o Rosemberg (que funciona como uma mistura entre os jornalistas Samuel Wainer e Carlos Lacerda) também rende ótimos momentos no longa. Como jornalista não pude deixar de gargalhar com cenas que mostram uma rotina insana de redação, especialmente a que para provar a fraude de uma empresa de caixa de fósforo – anunciante do jornal de Chatô que queria retirar o apoio – mobiliza toda redação para contar palitos de fósforos. Momento hilário e uma lição de (não) apuração. Algumas cenas se alongam sem necessidade, caso das interações com o Getúlio desgastam um pouco; mas não chegam a quebrar o ritmo. Alguns elementos como os momentos que Chatô invade a novela para dar uma notícia – geralmente desmoralizando um desafeto, também são divertidos.

Chatô é um filme de ficção sobre um personagem que faz parte da mitologia nacional. É um Brasil em exagero, uma caricatura, que se usa dos nossos clichês para fazer algo criativo, interessante, histórico (embora não exatamente com esse propósito) e principalmente criativo. Muito do que somos como imprensa – para o bem e para o mal – tem raiz em Chateubriand e Guilherme como diretor soube ser sutil e exagerado na hora de transportar isso para o cinema. Ou será que é tão inventado assim o universo onde “um Chatô” joga dinheiro para a plateia?

Confira o trailer:

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