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Dica de Segunda: Entre Nós (Filme de Paulo e Pedro Morelli)

Essa dica não é sobre uma música, mas você vai cDicaomeçar ouvindo “Na Asa do Vento” do Caetano Veloso e tenho com isso a intenção de que entenda um pouco do que eu sinto ao pensar, falar, lidar com esse filme. Enquanto digito isso já me engancho um pouco na vontade, o que me leva a pensar que talvez seja um pouco sobre a música também. “Muita gente desconhece oilará viu, muita gente desconhece”.

Para diminuir o nervosismo de parto que é todo o começo de texto (somado a essa necessidade de procrastinação onde fazemos tudo menos o que precisamos), comecei a selecionar as possíveis fotos que entrariam na resenha e ainda não tenho certeza se o processo ajudou muito, mas acredito que você que já gostou demais de um filme entenda essa necessidade de tirá-lo da cabeça (por isso escrever) e ainda assim não fazer ideia de como argumentar a favor, já que o principal motivo para que ele tenha entrado na lista de favoritos, é a mágoa profunda que ele causa em todas as frestas por onde entra. Se após a dose de confissão pouco profissional (que minha professora de redação me perdoe!) você continua acompanhando esse texto, merece conhecer do que vim falar, então prossigamos.

Entre_Nos

Para comemorar a publicação do primeiro livro do grupo, sete jovens escritores viajam para uma casa de campo, onde escrevem cartas a si mesmo para serem abertas dez anos mais tarde. A viagem termina em tragédia após a morte de um dos amigos, mas ainda assim, acompanhamos o encontro depois que o tempo passa e chega finalmente a hora de abrirem as cartas.

A sensação de que fomos traídos é irremediável a primeira vista: as coisas mudaram  e não há rodapé que mostre o que perdemos, ou explicação que não seja a nossa própria, que percebe inconformado, é a vida. Só, ou tudo isso que ela é.

Mesclando a alegria genuína de ter a vida inteira pela frente (1992) ao desespero ora blasé ora furioso de ver o que se fez dela (2002), somos envolvidos pela direção de Paulo e Pedro Morelli pouco comum em uma época onde a mania de perfeição habita, aqui eles estão mais preocupado com os detalhes, em mostrar a intimidade e aconchego de amigos que se conhecem há tanto tempo e mesmo assim (ou por isso) não sabem como se tratar ao perceberem que já não são os mesmos. O roteiro ficou nas mãos de pai e filho também, e então percebe-se o dom do trabalho em família: cuidado e leveza presente nas cores e sensações, sem o tal, a atmosfera pesada talvez tirasse a graça que têm os momentos de silencio ou agonia. Caio Blat (Felipe), Carolina Dieckmann (Lúcia), Maria Ribeiro (Silvana), Paulo Vilhena (Gus), Júlio Andrade (Cazé) e Martha Nowill (Drica) cuidam da tristeza verossímil, fato real que não precisa basear-se em coisa alguma: essa perca de juventude é natural na atuação porque não se trata de fingimento, cada um traz consigo essa carga de solidão e entrega que só aumenta mais a sensação de que a vida não é de outra forma, e um filme que decide tratar dessa efemeridade precisava carregar a ofensa pessoal. Não esqueci de Lee Taylor (Rafa), mas a ele sobra o mito, a esperança de um futuro diferente e impossível. O ator traz a personificação de como os casos deveriam prosseguir: vida extraordinária e reconhecimento, bem como a cena em que deixa o pássaro voar e a gente entende: desse cara vem coisa.

Untitled design

Aqui peço licença para citar o pensador contemporâneo Pedro Viáfora que diz em uma de suas letras “ninguém entende os nós de nós”, e eu agora re-significo a esses laços mal amarrados que dão ao filme o tom brutal que ele precisa ter, porque não é o grande momento, não se trata de clímax, é o susto desajeitado, a percepção covarde: “que puta saudade do que somos” e saber que o resto de tudo o que está por vir não estanca o medo de não ter corrido atrás do que a gente deveria ser. E esse texto que é sobre um dos melhores filmes nacionais (o meu critério amador de qualidade sempre rima com simplicidade) não pelo tanto de prêmios (merecidos) que recebeu, ou pela frase mais tapanacaradiárioeconstante que o Cazé solta em pequeno momento de admissão (“eu não sei o que é mais frustrante, se não é realizar nenhum sonho, ou realizar todos”), mas sim porque ao chegar aqui já sinto que esse embarace é providencial da apropriação nossa ao chorar entre uma cena e outra ou martelar “Na Asa do Vento” a noite inteira na cabeça. E se por acaso você assistir esse filme e tiver tanto medo do escaravelho de ponta cabeça quanto do nome que a história teria (“A Pele do Cordeiro”) você sabe bem do que aqui eu quis passar; já é hora de desfazer-se de sua casca queimada.

Assista o trailer de “Entre nós”:

Beatriz Farias

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2 thoughts on “Dica de Segunda: Entre Nós (Filme de Paulo e Pedro Morelli)

  1. Oi Bea, me pode tirar uma dúvida por favor? Assiti o filme ontem mas eu nao consigo entender a frase “Que puta saudade do que nós somos”. Que é o que o filme quer dizer com isso? Qual é o sentido prufundo da frase?
    Sou da alemanha e só aprendi o portugues num intercambio no brasil…ou seja entendo bem as palavras mas nao o significado da frase 🙂 Obrigado pela ajuda!!

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    • Olá Bastos!

      A frase é apresentada no filme na carta que um dos personagens se escreve para ler alguns anos na frente, anunciando a saudade que já sente da pessoa que foi, e de como são os seus amigos. Seria uma espécie de pré-saudosismo. Saudade de algo que ainda não foi modificado, mas que pela certeza de mutação devido ao tempo e as experiências que viverão, é antecipada. Vindo até como lamento de uma fase boa que não vai voltar.

      Quando ele diz “que puta saudade do que nós somos”, a palavra “puta”, utilizada geralmente no sentido pejorativo, aqui serve como um intensificador, dando o sentido de uma saudade muito forte. Acho que pode ter sido ela que confundiu o entendimento 🙂

      Obrigada pelo seu comentário, espero que tenho ajudado! Continue acompanhando o blog!

      Abraço!
      Beatriz

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