* Por Meiri Farias
Ravi Landim toca com os pés descalços. Pé no chão, como quem afirma seu lugar. Como quem busca raízes. E de raízes ele entende muito bem.
Na noite do último domingo (26), Ravi lançou seu disco no palco do SESC Belenzinho (que eu ainda não conhecia, apesar da minha intensa atividade na rede SESC. E mesmo na correria afobada de quem quase chega atrasada, impossível não notar a beleza e grandiosidade do lugar). O teatro recebe como entusiasmo o começo do show, Ravi apresenta a canção “Valsa para desapego” acompanhado apenas de seu violão enquanto canta como quem declama. Ou como quem faz uma oração. A banda se junta a ele – flauta, sanfona e percussão – preenchendo todos os espaços com a instrumental “Ribombo”.
Ravi é um artista em múltiplas atividades: Compositor, instrumentista, professor e contador de histórias. Desde 2008, atua como músico em festivais, casas de shows e peças teatrais – atualmente, trabalha com a Cia de Teatro Nois na Mala e no espetáculo infantil “Uma Jornada de João e Maria”, além de dar aulas de violão, guitarra e percussão. ” Filho de nordestino, nasceu em São Miguel Paulista no extremo leste da capital – bairro conhecido pela intensa migração nordestina – e cresceu imerso nessa cultura, influenciado desde cedo pelos sons da tradição do Nordeste.
“Das andanças e seus retalhos” também é fruto dessa influência. Com produção de Chico Saraiva (que se uniu a Ravi durante o show na música “Nganga”), o disco flerta com ritmos tradicionais brasileiros como baião, coco e a música de candomblé. No show, o CD se desdobra com a banda formada pelos percussionistas Abuhl Jr e Gustavo Cék, o sanfoneiro Cicinho Silva e as artistas Paula Duarte e Marília Duarte (vocais e flauta). Ainda há espaço para a participação especial do gaitista Diego Sales, da cantora Socorro Lira e Chico Saraiva, já citado.
O mais interessante na música de Ravi é a facilidade de se encontrar. O CD é novo, meu contato com seu trabalho também. Mas a impressão que se tem é a de redescoberta e não de novidade. Sensação de reencontro, de lembrança. Talvez se trate dessa identificação SP – Nordeste. Talvez seja apenas a capacidade que só um contador de histórias poderia ter para deslizar narrativas, mesmo quando a música é instrumental. Ravi traz todas suas histórias no violão e afirma suas raízes quando solta a voz.
A música “São Francisco, riacho e nós”, que ele dedicou à família durante o show, é um bom exemplo. “Permita, ó rio, que eu leve tua força em meu caminhar, a força de tanta Bahia que há em mim”, nos transporta para imensidão do “Velho Chico” e toda a sua gente, suas histórias.
Outra coisa importante de se destacar, é a sintonia da plateia durante o show. Em muito tempo, esse foi o primeiro show que percebi o público realmente entregue e atento. Prova maior disso, foi os pouquíssimos smartphones erguidos que surgiram. todos pareciam conscientes demais do mistério e preciosidade que é a música feita com o amor e de como esse momento se basta em sim mesmo. “Para se ouvir, basta não falar”, como canta Ravi em “Encabulado”, definitivamente, a minha favorita do disco.
O ponto negativo tanto do disco, quanto do show, é a sensação de que acaba rápido demais. Mas suas melodias e histórias continuam tocando e nos tocando internamente por um longo tempo, fazendo que suas raízes sejam um pouco nossas também e que sintamos, como Ravi, “Carregando a terra consigo pra todo lugar.”
Ouça “Encabulado”: